Sequenciamento pode identificar mutações ligadas ao autismo mesmo antes do nascimento de uma criança – especialmente nos casos em que os médicos suspeitam de problemas, dois novos estudos sugerem.
Nos estudos, os cientistas sequenciaram o DNA fetal apenas quando as ecografias revelaram desenvolvimento atípico de membros ou outros órgãos, e eles deram às famílias apenas os resultados que pareciam explicar esses problemas
Mas há um risco real de que outros possam usar a técnica para testar mutações em qualquer feto – e para transmitir todos os resultados aos pais – sem supervisão adequada, diz Ronald Wapner, professor de obstetrícia e ginecologia do Columbia Institute for Genomic Medicine, que liderou um dos estudos.
“Nem todos deveriam estar fazendo isso; deveria estar nas mãos de pessoas que têm experiência”, diz ele.
Outros tipos de análises já detectam mutações em um feto: Alguns detectam grandes segmentos de DNA que são trocados entre cromossomos, e outros podem pegar em cópias ausentes ou duplicadas de fragmentos de DNA.
Os novos estudos estão entre os primeiros a procurar por mutações através do exômen fetal -essencialmente, a coleção de genes em um genoma.
O campo está repleto de questões éticas, incluindo se os pais podem optar por interromper uma gravidez com base nos resultados. Mas os pesquisadores observam que a maioria das mutações que encontraram representam sérios riscos à saúde, que poderiam ser tratados ao nascimento ou no útero.
“Acho que muitas pessoas têm a concepção errônea de que esses testes são feitos para decidir se devem ou não interromper uma gravidez”, diz Christa Lese Martin, diretora do Instituto de Autismo e Medicina do Desenvolvimento de Geisinger, em Lewisburg, Pensilvânia, que não estava envolvida nos estudos. “Para mim, é dar informações às famílias e médicos para que possam planejar toda a gravidez, o parto e identificar melhor as necessidades da família e do bebê”
Resultado significativo:
A equipe do Wapner estudou 234 fetos com anomalias detectáveis em um ultra-som, como membros encurtados, excesso de líquido cerebral ou um rim deformado. O teste genético padrão não ofereceu nenhuma explicação para os achados do ultra-som.
Na maioria dos casos, os pesquisadores sequenciaram os exsomos fetais de células no líquido amniótico, sangue do cordão umbilical ou placenta; em outros casos, eles coletaram DNA após o nascimento. Em 24 casos, encontraram uma mutação que explicou a anomalia da ultra-sonografia.
No segundo estudo, os pesquisadores recrutaram 610 mulheres grávidas de 34 clínicas em todo o Reino Unido. Eles sequenciaram 1.628 genes associados ao atraso no desenvolvimento e descobriram mutações ligadas aos achados da ultrassonografia em 52 fetos. Eles relataram esses resultados aos pais somente após o nascimento.
Entre os dois estudos, que apareceram em fevereiro no TheLancet, identificaram mutações em 15 fetos em um dos nove genes do autismo, incluindo TSC2, ANKRD11, e SCN2A. Eles também descobriram novas conexões entre esses genes e problemas anatômicos. Por exemplo, a equipe de Wapner encontrou uma mutação prejudicial conhecida no SCN2A em um feto que tinha excesso de líquido cerebral, um elo relatado uma vez antes.
Os dois estudos analisaram todas as mulheres que compareceram a uma clínica em um período de tempo definido. Juntos, eles implicam que o seqüenciamento pode identificar uma causa genética para anormalidades ultrassônicas em aproximadamente 10% dos casos.
Os resultados sugerem que o seqüenciamento pré-natal deve ser usado na clínica, diz Michael Talkowski, professor associado de neurologia da Universidade de Harvard, que não estava envolvido nos estudos. Estudos prévios de sequenciamento pré-natal foram “aleatórios e não consistentemente feitos”, diz ele, enquanto os novos estudos fornecem uma referência mais confiável. Talkowski está trabalhando no sequenciamento de todo o genoma fetal, o que pode fornecer melhores resultados, mas esse trabalho é preliminar.
DNA flutuante:
Extrair células fetais acarreta um leve risco de aborto espontâneo. Um terceiro estudo descreve uma abordagem menos invasiva – seqüenciando o DNA fetal flutuante no sangue materno.
Usando este DNA “livre de células”, os pesquisadores seqüenciaram 30 genes associados a condições severas como a síndrome de Noonan, que está relacionada ao autismo; 14 dos genes têm ligação com o autismo. Alguns problemas associados a essas condições, como defeitos cardíacos, podem ser tratados antes ou logo após o nascimento.
Os pesquisadores identificaram uma mutação em 32 dos 422 fetos; seis das mutações estão em um dos três genes ligados ao autismo. Eles confirmaram até agora a presença da mutação em 20 desses casos após o nascimento, eles relataram em janeiro na Nature Medicine.
Este teste pode ser feito já na nona semana de gravidez, antes da maioria das anormalidades serem visíveis em uma ultra-sonografia oferecendo a chance de intervenção precoce, diz Jinglan Zhang, que liderou o estudo.
Técnicas que analisam o DNA livre de células detectam de forma confiável apenas três anormalidades cromossômicas, diz Martin; o sequenciamento pode analisar apenas algumas dezenas de genes e pode desencorajar os pais de tentar outros testes que poderiam fornecer resultados mais informativos.
O American College of Medical Genetics and Genomics estabeleceu diretrizes para informar as mulheres sobre as limitações dos testes livres de células. Entretanto, de acordo com um estudo realizado em abril, as empresas não seguem todas essas diretrizes.
O artigo apareceu pela primeira vez no Spectrum abril 10.
J. Lord et al., “Prenatal exome sequencing analysis in fetal structural anomalies detected by ultrasonography (PAGE): a cohort study”, Lancet, 393:747-57, 2019.
S. Petrovski et al., “Whole-exome sequencing in the evaluation of fetal structural anomalies: a prospective cohort study”, Lancet, 393:758-67, 2019.
J. Zhang et al., “Non-invasive prenatal sequencing for multiple Mendelian monogenic disorders using circulating cell-free fetal DNA”, Nat Med, 25:439-47, 2019.